quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

TOXOCARÍASE CANINA – REVISÃO DE LITERATURA





1 INTRODUÇÃO

  A toxocaríase é uma zoonose ocasionada pela ingestão acidental de ovos embrionados de nematódeos do gênero Toxocara. A toxocaríase é uma importante zoonose em países desenvolvidos (SANTARÉM et al., 2009).
   Os ovos do Toxocara canis são eliminados, não segmentados, com as fezes do cão. No exterior, em condições favoráveis de oxigênio, temperatura e umidade, evoluem, surgindo a larva infectante (FORTES, 2004).
  A espécie Toxocara canis tem importância significativa em medicina humana, quando os ovos infectantes são ingeridos pelo homem, ocorrendo migração pela via linfática ou circulação sanguínea.   As larvas em estagio dois limitam comumente sua migração ao fígado, sendo responsável por granuloma eosinófilo; entretanto, ocasionalmente podem atingir o globo ocular, provocando deslocamento de retina. Estas larvas que não estão em seu hospedeiro adequado e por isso não conseguem terminar seu ciclo evolutivo são denominadas de larva migrans visceral (FORTES, 2004).

2 ETIOLOGIA

  O Toxocara canis é um nematódeo com aproximadamente 4,0 a 18,0 cm de comprimento, cujo hospedeiro definitivo é o cão. Esse parasito pertence ao filo Nemathelmintes, classe Nematoda, ordem Ascaroidea, família Ascaridae e subfamília Ascarinae (SANTARÉM et al., 2009). O T. canis possui corpo cilíndrico e alongado, recoberto por uma cutícula lisa. Não possui sistema circulatório e respiratório. São animais de sexo separado, sendo comum o dimorfismo sexual. Os ovos são casca espessa, finamente corrugada, e medem de 85 a 90 μ por 75 μ (FORTES, 2004).
  Os hospedeiros do T. canis incluem caninos e felinos, onde se localizam no intestino delgado nutrindo-se das substâncias líquidas do quimo (FORTES, 2004).
   Os grandes helmínticos cilíndricos de cachorros e gatos são comumente encontrados, especialmente em filhotes. Das três espécies, Toxocara canis, Toxascaris leonina e Toxocara cati, a mais importante é T. canis, não somente porque as larvas podem migrar no homem, mas porque as infecções fatais podem ocorrer em filhotes de cachorro. T. leonina ocorre mais frequentemente em cães adultos e, menos frequentemente, em gatos. Estas espécies também ocorrem nos carnívoros selvagens (FRASER, 1996).

3 CICLO BIOLÓGICO

  Os ovos de T. canis são eliminados nas fezes dos cães infectados, no exterior em condições favoráveis de oxigênio, temperatura e umidade, evoluem, surgindo a larva infectante (L2). O cão se infecta pela ingestão do ovo com L2, que libera no intestino delgado a larva infectante que penetra na mucosa intestinal, a migração que se segue depende da idade e sexo do cão (FORTES, 2004).
   Os ovos sofrem ação de suco gástrico e as larvas eclodem no intestino delgado, atravessam a parede intestinal, seguindo pela veia porta ou vasos linfáticos ate o fígado, coração e então para os pulmões.     Nos pulmões, as larvas rompem os bronquíolos, alcançando a traqueia, quando são deglutidas e retornam ao intestino delgado, onde se desenvolvem até a sua forma adulta. Após 21 dias da ingestão dos ovos, as fêmeas adultas de T. canis são capazes de produzir diariamente até 200.000 ovos, que serão eliminados juntamente com as fezes dos animais tornando-se infectantes em duas a cinco semanas, sob condições ambientais adequadas (SANTARÉM et al., 2009).
   A segunda rota de migração é a somática, onde as larvas que chegam aos pulmões retornam para o coração pelas veias pulmonares, de onde sua migração para outros órgãos é facilitada. As larvas passam para um estágio de hipobiose em tecidos ou órgãos como fígado, rins, olhos e cérebro (SANTARÉM et al., 2009).
   Nos filhotes com até 40 dias de idade, que se contaminarem com a ingestão de ovos infectantes de T. canis, o ciclo evolutivo é o clássico, o ciclo pulmonar. Em filhotes com mais ou menos três meses de idade ocorre o ciclo evolutivo clássico, com ciclo pulmonar, mas algumas larvas não chegam à faringe via pulmonar, mas alcançam as veias pulmonares, e do coração são distribuídas a diferentes órgãos pela grande circulação. Filhotes não possuem resposta imunológica eficiente, por isso nesses animais as larvas fazem o ciclo pulmonar, retornando ao intestino delgado, onde evoluem para formas adultas. Em cães com idade acima de seis meses, que ingerirem ovos infectantes de T. canis, somente um pequeno número de larvas realiza o ciclo evolutivo clássico; o maior número de larvas, pelas veias pulmonares, vai ao coração e através da artéria aorta é distribuído aos mais diversos órgãos do hospedeiro. A partir de seis meses os animais já possuem resposta imunológica adquirida contra o parasito, assim elas evadem para os tecidos onde permanecem em hipobiose (FORTES, 2004).
   As cadelas que ingerirem ovos infectantes de T. canis, a maioria das larvas (L2) também realiza migração somática e após oito dias são encontradas em diferentes tecidos como fígado, pulmão, rins e aí permanecem sem evoluir, durante um tempo relativamente longo. Durante a prenhez da cadela algumas larvas são mobilizadas e por via transplacentária atingem o feto, localizando-se no fígado mudam para L3. Por ocasião do nascimento dos filhotes, as L3 são encontradas nos pulmões, mudam para L4 na luz alveolar e atingem a faringe, quando então são deglutidas. No duodeno mudam para adultos jovens e tornam-se adultos maduros ao final da terceira semana de vida dos filhotes. Além da via transplacentária as larvas também podem alcançar as glândulas mamárias e serem transmitidas pela via lactogênica, desde a ingestão do colostro até os 45 dias de lactação. A infecção pré-natal ocorre quando as cadelas se infectam antes ou imediatamente após serem fecundadas (FORTES, 2004).
   Em cãezinhos, o modo usual de infecção com T. canis é a transferência transplacentária; se os filhotes menores de 6 semanas de idade ingerirem os ovos embrionários, as larvas eclodidas, ao alcançar os pulmões são expelidas pela tosse e engolidas, maturando em adultos capazes de colocar ovos no intestino delgado. Entretanto, quando ovos infectivos de T. canis são engolidos por cachorros mais velhos, as larvas eclodem, penetram a mucosa intestinal e migram para o fígado, pulmões, músculos, tecido conectivo, rins e muitos outros tecidos. Na cadela prenhe, estas larvas hibernantes são mobilizadas e migram para o feto em desenvolvimento e, eventualmente, alcançam o intestino dentro de 1 semana logo após o nascimento. Algumas larvas migram para a glândula mamária, de forma que o cachorrinho pode ser reinfectado pelo leite. Durante este período perinatal, a imunidade da cadela à infecção por ascarídeo é parcialmente suprimida e grande número de ovos pode ser eliminado (FRASER, 1996).
    A viabilidade nas cadelas é de 385 dias; e nem todas as larvas são mobilizadas durante a gestação, assim outras permanecem aguardando novas gestações. O mecanismo de reativação das larvas não é bem conhecido e admiti-se relação com alterações hormonais ou redução na imunidade (FORTES, 2004).
    Os cães podem ingerir as larvas infectantes em hipobiose dos tecidos de hospedeiros paratênicos, como roedores e aves. Nestes animais, após ingestão dos ovos embrionados, ocorre migração somática e as larvas permanecem em hipobiose sem concluir o ciclo (SANTARÉM et al., 2009).
   As larvas dos nematóides ascarídeos podem migrar pelos tecidos de vários animais, fornecendo assim uma fonte alternativa de infecção, particularmente para gatos e carnívoros selvagens. Esta migração também ocorre se os ovos forem engolidos pelo homem. A maioria das infecções humanas é assintomática, porém febre, eosinofilia persistente e hepatomegalia (algumas vezes com comprometimento pulmonar) podem ocorrer, provocando uma doença conhecida como larva migrante visceral. Raramente, a larva pode alojar-se na retina, causando prejuízo à visão (larva migrante ocular) (FRASER, 1996).
   Os ciclos de vida da T. cati e da T. leonina são similares, exceto pelo fato de que, na primeira, não ocorre infecção pré-natal, enquanto na segunda, a migração é restrita à parede intestinal, de forma que não ocorre transmissão pré-natal nem transmamária (FRASER, 1996).

4 EPIDEMIOLOGIA

   A prevalência de cães portadores de T. canis pode variar segundo a idade e o sexo dos animais. O T. canis normalmente é observado em filhotes com ate quatro semanas de vida, sob forma aguda (SANTARÉM et al., 2009).
  Em cães adultos a prevalência de T. canis é mais baixa, uma vez que as larvas migram e permanecem em hipobiose. Entretanto, em casos em que há comprometimento na resposta imune nesses animais, o ciclo hepato-traqueal se completa e as larvas chegam à sua forma adulta no intestino produzindo grande quantidade de ovos (SANTARÉM et al., 2009).


5 SINAIS CLÍNICOS

   Os sinais estão na dependência do número de T. canis que o animal alberga. Em infecções leves, geralmente o parasitismo passa despercebido; entretanto, se a infecção for maciça, as manifestações podem ser de dois tipos: as causadas pelas larvas que migram e as causadas T. canis adultos. Os sinais causados pelos vermes adultos incluem retardo do crescimento devido à perda de apetite, perda de peso, febre, ventre proeminente, raquitismo, alterações intestinais, cólicas e vômitos. E os sinais causados pelas larvas durante a migração em infecções maciças são tosse, febre, dispneia, pneumonia e icterícia, por lesões causadas ao fígado (FORTES, 2004).
   A migração das larvas pela árvore brônquica promove reação inflamatória dos pulmões, lesões no fígado, podem atingir os rins causando nefrite, coração e sistema nervoso central ocasionando lesões irreversíveis (FORTES, 2004).
   A primeira indicação de infecção nos animais jovens é a falta de crescimento e a perda da condição física. Animais infectados têm pelos eriçados e são frequentemente “barrigudos”. Vermes podem ser vomitados e comumente evacuados nas fezes. Nos primeiros estágios, podem ocorrer lesões pulmonares devido à migração das larvas; estas podem-se complicar com pneumonite bacteriana, de modo que dificuldade respiratória de gravidade variada pode sobrevir. Diarreia com excesso de muco pode ser evidente (FRASER, 1996).
  Nas infecções graves em cachorrinhos, são comuns pneumonia verminótica, ascite, degeneração gordurosa do fígado e enterite mucóide. Granulomas corticorrenais contendo larvas são observados com frequência em cães novos (FRASER, 1996).

6 DIAGNÓSTICO

   A infecção em cães e gatos é diagnosticada pela detecção de ovos nas fezes, pelo método de flutuação. É importante distinguir os ovos esféricos e de casca irregular de Toxocara spp do ovo oval de casca lisa de T. leonina, devido à importância dos primeiros em saúde pública (FRASER, 1996).        Assim como pela sintomatologia clínica apresentada pelo paciente; em filhotes com proeminência abdominal, perda de apetite, diarreia e pneumonia sugerem infecção pelo T. canis.


7 TRATAMENTO

    Os sais de piperazina ainda são largamente utilizados para tratamento de parasitoses. Os compostos de maior espectro incluem diclorvos, febantel, fenbendazol, flubendazol, mebendazol, nitroscanato, oxfendazol e pamoato de pirantel. A dietilcarbamazina e a ditiazanina também são empregadas (FRASER, 1996).

8 CONTROLE E PROFILAXIA

     Os ovos no solo e as larvas somáticas das cadelas são os reservatórios principais de infecção. A transmissão perinatal de infecção é grandemente reduzida por doses diárias de febendazol administradas às cadelas do 40º dia de gestação até o 14º dia após o parto. Se isto não for feito, para minimizar a saída de ovos, os filhotes devem ser tratados tão cedo quanto possível; idealmente, o tratamento deve ser iniciado 2 semanas após o nascimento e repetido a intervalos de 2 a 3 semanas até os 3 meses de idade. As cadelas em lactação devem ser tratadas nos mesmos dias. Os programas profiláticos para vermes cardíacos que utilizam estirilpirídio ou oxibendazol combinado à dietilcarbamazina também ajudam a controlar a infecção intestinal por ascarídeos (FRASER, 1996).
     Como os ovos aderem-se às patas, pelos, pele e outras superfícies, além de se misturarem ao solo e à poeira, a higiene rigorosa deve ser observada pelas pessoas, particularmente crianças, expostas a animais ou ambientes potencialmente contaminados (FRASER, 1996).
    A higiene é a medida mais importante para controle, as fezes devem ser removidas dos canis, os pisos devem ser concretados para melhor limpeza, o canil deve ser projetado para que fique exposto ao sol a maior parte do dia e combater certos animais como ratos, baratas, que são hospedeiros paratênicos (FORTES, 2004).







REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FORTES, E. Parasitologia Veterinária. 4. ed.rev. e ampl. São Paulo: Icone, 2004.

FRASER, CLARENCE M. Manual Merck de Veterinária: um manual de diagnóstico, tratamento, prevenção e controle de doenças para o veterinário. 7. ed. São Paulo: Roca, 1996.


SANTARÉM, V. A.; ELEFANT, G. R.; CHESINE, P. A. F.; LELI, F. N. C. Toxocaríases canina e humana. Veterinária e Zootecnia. p. 437-447, v.16, n.3, 2009.
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